O rapé se encaixa perfeitamente em várias ocasiões do cotidiano nas aldeias e também da cidade. Seus efeitos e benefícios são muitos, o que faz dessa medicina uma parceira inseparável de todos aqueles que a conhecem. Aqueles que estão iniciando a caminhada com rapé geralmente consagram mais o rapé em rituais, já as pessoas que estão a mais tempo estudando essa medicina, tendem a expandir as formas e momentos de consagração para seu dia-a-dia. Aqui vão 5 momentos em que o rapé é consagrado:
Fora de cerimônias, o rapé também é usado em momentos de alegria, para celebrar a família e amigos após um dia de trabalho, em rodas de conversa, sempre com conversas positivas e edificantes, contando histórias e piadas, falando sobre planos e metas, celebrando o pôr do sol, ouvindo o som dos pássaros ou de uma boa viola, por exemplo. A presença do rapé em uma roda de conversa por si só, eleva a qualidade do diálogo e da troca que ali acontece e deixa as pessoas mais abertas para assuntos profundos, como superação de dificuldades, aspectos de nossa personalidade que queremos melhorar, força para superar uma situação difícil, etc. O rapé torna uma roda entre amigos, família, txais, algo muito mais sagrado.
Vale frisar que mesmo nesses momentos mais descontraídos nunca se perde o respeito pela medicina, sempre é consagrada com reverência. Aqueles que tem conexão com a medicina do rapé conseguem usá-la em momentos e contextos diferentes sem perder o sagrado. A linha entre o sagrado e o profano é tênue, e quem controla isso somos nós mesmos com nossas intenções e pensamentos na hora da consagração.
2 - PARA MEDITAR
Para potencializar uma experiência meditativa também é usado o rapé. Consagrar e fechar os olhos é o suficiente para uma experiência diferenciada, pois a medicina da floresta é uma expansora do estado meditativo, ou seja, ela auxilia e torna as meditações mais fáceis e profundas. Na força do rapé é mais fácil de se concentrar e manter a mente quieta, sem barulho, pois como sabemos, a medicina cessa o fluxo de pensamentos.
Como uma medicina que impele a introspecção, o rapé nos traz esclarecimento sobre situações cotidianas, sobre nossas atitudes e palavras e nos leva a boas e necessárias reflexões internas.
Em certa vez com os txais Huni Kuins, precisávamos passar por boa parte de mato pra chegar até um riozinho, logo após uma noitada de ayahuasca, no nascer do sol. Logo os txais pegaram o rapé, sopraram da forma que vou ensinar aqui, e assim ficamos mais dispostos para cursar o trajeto pela mata.
Também é comum entre as etnias tradicionais do Brasil, consagrar o rapé antes de sair para caçar. Ele aguça os sentidos e traz disposição física. Para nós nawas, costuma ser difícil correlacionar rapé com disposição, visto que a maioria das experiencias são fortes e acabam ficando com moleza. Mas aí que está a diferença, se nós queremos um rapé para disposição, não podemos encher a mão de rapé. O sopro para disposição é um sopro forte, rápido (sopro do txashu) mas com bem pouco rapé.
4 - PARA FOCAR / CONCENTRAR
Em trabalhos que exigem foco e atenção tem-se o auxílio primoroso do rapé. Rapés que trabalham mais nessa área, como o Bashawa dos Varinawá, Mulateiro e Cumaru são os mais utilizados. O rapé tem o poder de manter nossa atenção focada em uma tarefa por mais tempo, como ler um livro, estudar ou escrever.
Claro que, sabemos que quando se rapela nós abrimos o nosso campo espiritual, por isso, sempre prezar pela consagração em concentração, em locais organizados e tranquilos.
5 - EM CERIMÔNIAS DE AYAHUASCA
A união dessas medicinas proporciona um momento eminente e sagrado. É a hora que o rapé nos mostra sua força mais alta, potencializada. Expansão, limpeza, flow, são todas sensações que podem decorrer dessa união. O rapé e ayahuasca são igual queijo e goiabada, foram feitos um pro outro! É de praxe em rituais indígenas a consagração de um rapé para abrir e para fechar o ritual, além de um sopro entre cada um dos despachos. Nos dias atuais, com a alta propagação do neoxamanismo no Brasil, o rapé se tornou uma medicina indispensável na maioria dos centros ayahuasqueiros.
Os três momentos mais comuns de se consagrar o rapé nos rituais são simples: antes, durante e depois. Recebendo a medicina antes do ritual, ela faz uma limpeza no nosso campo espiritual e libera bastante tensão e ansiedade, comumente acumuladas nos momentos prévios da consagração do nixipae. Já quando se consagra o rapé durante o ritual, costuma ser o momento ápice da noitada. O rapé chega como uma flecha certeira trazendo a clareza e potencializando a força. A miração se colore e por instantes ficamos em um estado flow, como se o tempo parasse ali. Já quando consagrado logo após o ritual, o rapé vem com o propósito de limpeza das energias acumuladas e para dar um ‘’basta’’ na força da ayahuasca.
Quando estamos na força da ayahuasca (nixi pae – uni) nosso campo espiritual fica muito aberto e sensível. Quem já teve o prazer de passar por essa experiência sabe que até uma pessoa que passa em absoluto silêncio perto de nós, nós podemos sentir e ver, de olhos fechados, o movimento daquela pessoa e as vezes até identificar quem é, apenas sentindo sua energia. Nós ficamos completamente receptíveis a qualquer energia externa. Por isso é tão importante a busca de um local sério e de confiança para consagrar ayahuasca. Palavras erradas ditas pra uma pessoa na força, um comando errado que você recebe, são coisas que entram muito facilmente no seu sistema, quem dirá um sopro de rapé. Então em rituais, preze em dobro pela escolha de quem irá lhe soprar.
Omar Gibran é estudante das medicinas da floresta e das culturas indígenas.
@txaigibran
Nesta série de vídeos você encontrará tudo o que precisa saber sobre o rapé. Suas origens, seus efeitos , como ele pode te ajudar e te curar.
Vai entender a força desta medicina e como os povos indígenas já vem utilizando esse pó sagrado há milênios.
Também vamos explicar como fazer a auto aplicação de maneira correta, o ritual prévio respeitando sua tradição ancestral e seu significado. Os tipos de aplicadores, sopros e muito mais.
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